açorianos '03

Continuando meus esforços em me inserir no meio cênico porto-alegrense, fui assistir ao prêmio açorianos, ontem, vinte e cinco, no renascença. chego tarde, uma fila imensa e, tendo saído meia hora antes do fim da aula, fico lá atrás, na última fileira, que não tinha encosto, com Juliano, um amigo (a foto do mês de março do calendário oficial do fsm é ele, numa performance na marcha pela paz; aliás, eu esqueci de levar o calendário pra ele ver, é, sinto muito). então... a pompa começa com uma pianista ruiva pensando ser a Tori Amos, mas bem menos virtuosa; homenagens pros (medicamente) mortos no ano que passou (Palese e Karam), e finalmente os prêmios.

Dos que vale a pena destacar (pois afinal não são todos que vale a pena destacar), o maravilhoso Grand Genet - Nossa Senhora das Flores, que ganhou espetáculo de dança, bailarino (Alex Sander dos Santos), bailarina (Luciana Dariano) e direção (Biño Sauitzvy).

Essa peça é incrível, não se trata de uma história linear, é o pensamento e a tragédia existencial de Jean Genet, escritor e dramaturgo francês morto em '86 e biografado por Jean Paul Sartre em Saint Genet - ator e mártir. Pensamento e tragédia dançados/encenados em dois planos paralelos, sendo que um desses planos contém o semideus Nando Messias, coreografando Billy Holliday, Edith Piaf e outras vênus dos cabarets, ans soixante. Messias, citando Divine, personagem de Genet, após coreografia sobre uma cadeira, o olhar fixo à frente se voltando para a platéia:

"De tanto repetir para mim mesma que não estou viva, acabo aceitando o fato das pessoas não mais me considerarem"

Não dá pra medir, é verdade, realmente não dá pra medir o impacto que esse espetáculo produziu em mim (ou em mrs. jesus, não sei mais). Cheguei a pensar em falar só de Genet num trabalho pra um seminário de psicanálise, depois desisti, mas mesmo assim Genet está lá. Citei Sartre, mas poderia ter citado Messias se não fossem as impossibilidades de tradução impostas pela própria natureza de sua arte.

Pois não é que Messias foi injustamente esquecido na premiação, só sendo indicado a melhor ator coadjuvante por All That Fall, peça que eu perdi (droga, droga, passou bem nos dias do fórum). Alex ganhou, ok, eu preferiria que tivesse ganhado Messias, mas tudo ficou legal quando aquele agradeceu Heloísa, sua mais antiga mestra, que agora me dá aulas duas vezes por semana de dança contemporânea no núcleo do Aldo Gonçalves.

E foi com Heloísa que eu me encontrei agora pela manhã, e trabalhamos nossas quatro coreografias, à música de Claude Bolling, e, aham, elas tem estranhos poderes de me deixar interessado por contemporânea, cada vez mais e cada vez mais eu me torno um fantoche daqueles movimentos ilimitados e esquizodirecionados. De modo que clássico e jazz (sim, eu também tenho aulas de clássico e jazz) transformam-se em meros futuros instrumentos.