kassandra in process

Teatro vivencial. Um conceito. Uma forma. Múltiplos cenários onde o espectador é convocado a transitar em duas horas do mais carnal dos envolvimentos. Na Terreira da Tribo (João Inácio, 981, Navegantes), a divisão palco-platéia esfacela-se. É o público que deve encontrar o lugar de onde quer assistir à primeira das guerras. Não há escolha. Entrando, experimenta-se a peça, dessa vez com todos os sentidos. Ser empurrado por carrascos troianos ou beijado por uma Polixena loira e nua. Espera-se tudo em meio a ladainhas indianas e licores de anis.

Toda uma lógica cênica que convida a um espetáculo de imagens grotescas. Estranhamento constante. Idéia e ação realizadas numa simultaneidade tensa. A construção dos personagens é a concebida por Artaud, o ator possuindo em mãos os poderes de construir a persona em ondulações gestuais próprias e não-suas, reconstituídas e aprimoradas a cada exibição. Mais um conceito, mais sangue que corre à frente dos olhos. Em work in progress, a construção da peça acontece sempre, de forma que o texto é modificado, adaptando-se às necessidades expressivas do grupo.

Faço a prova da dor. Como o médico que pinça um músculo para saber se está anestesiado, pinço minha memória. Talvez a dor morra antes da nossa própria morte. Faço a prova da dor e recordo as despedidas.

Aos que vêm depois de nós, a nossa morte. Experimetação saborosa onde tempo e espaço perdem-se em um linguajar onírico. Há textos em várias línguas. Christa Wolf serve de base, uma vez que uma novela sua situa a guerra de Tróia no ponto de vista de Kassandra, filha renegada da nobreza troiana. Rimbaud, Camus e Neruda intercalam-se a trechos do Mahabharatha indiano, contrubuindo para um transporte ao cosmopolitismo helênico. Figurinos de sedas e cizal elevam ao etéreo a plástica representativa. Odores mutantes inundam o ar. Os mesmos para atores e espectadores.