- Por que pinta isso?
- Para todos lembrarem que morrerão.
- Não vão ficar felizes.
- Têm sempre que ficar felizes? Às vezes é bom assustá-los.
- Não vão olhar a pintura.
- Claro que vão. Um crânio é mais interessante do que uma mulher nua.
- Se assustar as pessoas...
- ...elas vão pensar.
- ...elas vão pensar e ficarão mais assustadas. Vão correr para os padres.
- Não é problema meu.
- Continuará sua pintura?
- Pinto, e cada um vê como quer.
- Muitos o amaldiçoarão.
- Sim, mas depois pintarei algo que os agrade. Preciso viver. Pelo menos enquanto a peste não me pegar.
- A peste? Desagradável.
- (aponta para uma parte do mural) Veja como as pessoas ficam com o pescoço inchado. O corpo fica todo contraído, e os membros amolecidos.
- Parece horrível...
- Sim, é horrível. A pessoa tenta se livrar do inchaço. Morde as mãos e arranca as veias com as unhas. Seus gritos são ouvidos de longe. Eu o assustei?
- Assustar? Não me conhece. O que pintou ali?
- É incrível, mas as pessoas acham que a peste é um castigo de Deus. E aquelas que se consideram escravas do pecado se flagelam pela glória divina.
- Elas se chicoteiam?
- É horrível. Alguns se escondem para não vê-las passar.
- Você tem gim? Passei o dia tomando água e ainda me sinto como um camelo no deserto.
- (vai pegar a garrafa) Acho que está com medo.

(Ingmar Bergman, 1957, O sétimo selo, cena V)