salomé, sem cabeça

blood roses, blood roses

Salomé é a diva condenada à posteridade. A cabeça de um homem, aquilo que ela não tinha e não poderia ter. A cabeça daquele que não a quis, aquele que não foi seduzido por seus olhinhos lituanos, aquele que lhe quebra os espelhos e fala que existem outros além dela mesma. Aquele que falta a ela e, estando longe de seu controle, continua pulsando durante o sono. Ela pede, a mulher pede nela, empunhando uma espada brilhante de onde pingam gotas de sangue.

Vermelho é a cor do estranhamento e ao mesmo tempo a cor de um líquido que circula no interior e provoca toda a sorte de reações quando aflora à superfície, revelando o que lá dentro se encerra fluido: uma mulher. Condenada à humanidade, a mulher fala o seu desejo com todo o corpo. Dança com o ventre, uma barriga que ondula e infla; o ar, ao sair, sai em voz e em quedas contemporâneas em espiral.

Animal prematuro, Salomé grita na Bíblia, sussurra em Wilde. Ela está bem atrás de cada palavra, tentando captar o sentido escondido lá onde não pode ir. Ela está na pretensão em cada gemido de resumir tudo, em pouco. Salomé é a parte constituinte que quer aquilo onde não é. A cabeça de João Batista, a parte que lhe falta e que, quando ela a possui, hermafrodita, morre. Mas não sem ser antes a rainha da Armênia e dizer que o mistério do amor é bem maior que o mistério da morte.